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Corpo e Dualidade

Padecemos da escravidão que nos impõe o fato de não termos senão um só corpo. O homem civilizado não consegue aceitar os limites constantemente fixados por esta corporalidade exclusiva. A necessidade de desafiar a finitude por ela decretada é constante. A ilusão de superá-la permanente. E no entanto, como já foi dito, ‘a anatomia é o destino’.

O corpo cumpre indefectivelmente sua parábola vital independente de nossos desejos. Ali está quando, na infância, começamos a reconhecê-lo, continua estando ali quando, desgastado e murcho, já não queremos reconhecê-lo nem ele nos reconhecer. O corpo, no entanto, se obstina em nos impor a dura evidência da nossa morte. A crucial simultaneidade entre seu fim e o nosso.”

Fonte: O Dualismo – Estudo sobre o retrato de Dorian Gray. Eduardo Kalina e Santiago Kovadloff. Tradução: Oswaldo Amaral. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989.

Quando nos sentimos frustados

Ao longo da vida passamos por situações, as mais variadas, que nos despertam diferentes emoções e sentimentos. Quando somos tomados por bons sentimentos, via de regra, nos sentimos plenos, leves e realizados. Achamos que a vida vale a pena, que as coisas caminham bem, e sentimos que podemos continuar a trilhar naquela direção.

Entretanto, quando somos tomados por sentimentos ditos “negativos”, como raiva, ódio, ira, inveja, dentre outros, não gostamos das sensações despertadas. São sensações incômodas que, em geral, acordam “leões” adormecidos dentro de nós e nos levam a questionar o caminho que estamos seguindo. Podemos nos sentir perdidos, inseguros e assustados com a intensidade com que somos tomados pelas situações.

Quando isso acontece, nossa tendência é tentar anular esses sentimentos, seja pela supressão, repressão ou pela simples liberação (descarga) de tudo aquilo que estamos sentindo. Sentimo-nos frustrados e queremos que tudo aquilo passe logo. A dor sentida é grande e, então, temos medo de não agüentar e explodir, ou de nos perdermos no abismo profundo de nosso lado “negro”.

Essas sensações desagradáveis despertadas são tanto mais insuportáveis de lidar conforme a capacidade que temos, ou não, de contê-las e transformá-las, de modo a se tornarem úteis para nós. Esse processo está ligado a nossa capacidade de tolerar frustrações.

Embora seja sempre muito desagradável a sensação causada pela frustração, podemos tirar partido dessa situação em prol de nosso desenvolvimento pessoal.

Você deve estar se perguntando, como sentimentos ruins e sensações desagradáveis podem se tornar úteis para nós de algum modo. Pois bem, eles não só podem, como são necessários para o amadurecimento psíquico e para a integração de nossa personalidade.

Por mais que lutemos contra, é fato que não somos só constituídos de sentimentos nobres e emoções agradáveis. Do mesmo modo, nem sempre conseguimos, em nossa vida, ter reações adequadas e socialmente aceitas. Entretanto, temos a tendência de tentar, a todo custo, evitar sentimentos desagradáveis, nos permitindo apenas “sentimentos nobres”, “emoções prazerosas” e “reações mais adequadas”.

Somos seres dinâmicos e, como tal, constituídos de luz e sombra, amor e ódio, paz e conflito. Existem camadas de nosso psiquismo e partes de nossa personalidade que ainda não conhecemos. O que há em nós de conhecido se contrapõe a tudo que não sabemos ou não tomamos contato, que é nossa sombra. E essa sombra nos constitui tanto quanto o que há de “luz” em nós. Sem ela, não somos inteiros, não estamos íntegros. Acabamos compondo só uma parte da história, como se houvesse só “mocinhos”.

Entretanto, não há história completa sem “bandidos”, que representam tudo aquilo que há de não-conhecido, não-aceito ou não-integrado em nós. Eles nos incomodam muito, e enquanto permanecem inconscientes, aprisionados em nosso “calabouço” psíquico, atuam sorrateiramente, provocando diferentes emoções, sensações, e reações muitas vezes impensadas, inesperadas, ou até mesmo compulsivas, que podem parecer sem sentido ou caminhando na contramão da nossa vontade consciente.

Se houver disponibilidade para encarar nossos próprios inimigos internos podemos nos surpreender com o resultado. “Dar vida” ao lado negro e obscuro de nossa personalidade, pode ser o caminho não só para que não sejamos pegos de calça curta por nossos “bandidos”, como para que possamos integrá-los em nossa personalidade, enriquecendo nossa experiência emocional e propiciando o desenvolvimento psíquico.

Sempre que há frustração é útil nos perguntarmos o que, em nossas expectativas, não foi atendido. Não há frustração sem expectativa prévia.

Quando podemos nos deixar tomar pelas emoções desagradáveis e nos darmos o tempo necessário para o processamento, em nosso mundo interno, de tudo que nos é despertado por aquela situação, então, teremos condição de pensar sobre a experiência, tirando dela algum significado que pode vir a representar um ganho em termos de crescimento emocional.

Diante de situações de dor e frustração, podemos tentar, em primeiro lugar, sentir o que está vindo à tona. Conforme os sentimentos forem aparecendo, podemos nos questionar:

O que esses sentimentos despertados significam?;

O que eu esperava que não alcancei?;

O que essa frustração está me ensinando sobre meu mundo emocional e sobre o mundo emocional da outra pessoa com quem eu me relaciono nesse momento de dor?;
Quais são as crenças que tenho sobre mim, a vida, o prazer, o sucesso, os relacionamentos, e que essa situação só vem reafirmar?;

Há algo que eu possa fazer por mim, nesse momento, para aliviar a carga dessa frustração? (desde que não seja ter outros comportamentos que, mais tarde, trarão mais arrependimento e frustração, como no caso da pessoa que começa a comer demais para tentar não sentir e não olhar para aquela dor, ou daquela que gasta todo seu orçamento mensal e depois se arrepende ficando com várias dívidas para acertar);
O que eu fiz ou como eu contribui para que o resultado da situação fosse esse?;
O que eu posso fazer para que, de uma outra vez, o resultado seja diferente?;
O que essa situação me acrescenta em termos de conhecimento sobre a vida, sobre as pessoas, sobre os relacionamentos, de modo que eu possa me capacitar melhor para outras situações que a vida ainda me reserva?

Essas e outras questões podem nos ajudar a lidar com a sensação de frustração.

Se observarmos mais a fundo, veremos que muitas vezes deixamos de viver e esperar, desejar e sonhar na vida, com medo da frustração. Quando temos pouco ou quase nenhum contato com nosso mundo emocional nos assustamos com o que sentimos diante da frustração e temos medo de não encontrarmos sustentação e aparato internos para lidar com a situação. Sentimos que não há esperança.

Na tentativa de nos livrarmos da dor, tendemos a nos anestesiar e nos refugiar em algum espaço dentro de nós onde nos sintamos seguros. Buscando evitar sofrimento, deixamos de viver, e assim, sem perceber, seguimos como “mortos-vivos”, sem nos envolver diretamente em nada, seja um trabalho, um projeto, um relacionamento, um tratamento, etc.

O fato é que, assim, estamos evitando a própria vida, abrindo mão de vivê-la. Se algum projeto, trabalho, relacionamento ou tratamento teria alguma chance de dar certo, de trazer prazer, bem-estar e realização, nunca saberemos, porque diante do temor de não conseguir ou perder, estamos escolhendo não tentar.

A fuga das emoções e sentimentos negativos é uma escolha que nos tira do contato verdadeiro com nosso ser, nos afasta de quem somos e nos deixa cada vez mais esvaziados. No final das contas, ao contrário do que possa parecer, evitar nossas emoções negativas, nos deixa frustrados e sem sentido para a vida.

Só o contato real e verdadeiro com tudo o que há de mais vivo em nosso íntimo, sejam emoções agradáveis ou desagradáveis, sentimentos “nobres” ou “mesquinhos”, permite que nos sintamos seres inteiros e fortalecidos, fazendo dos momentos de dor e crise, oportunidades para o crescimento e transformação, no caminho de uma vida mais plena e feliz.

*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.

Moralidade ou Ética?

Quem vive nas profundezas do seu ser
Nada sabe de virtuosidade.
Dele brotam espontaneamente
As íntimas forças da vida.
Quem vive na superfície de seu agir

Não pode fazer brotar as forças profundas.
Quem vive nos abismos da sua alma
Ignora a moralidade do seu agir.
Desconhece o que seja ego-agência.
Quem vive na superfície da sua alma
Age egoicamente, visando fins externos.
O amor impele ao agir,
Mas não quer nada para si.
A justiça impele ao agir
Mas não age por ambição.
A moral também impele ao agir
E, se não consegue o que quer
Recorre à violência.
Por isto, ó homem, reconhece:
Quem não tem a visão do Tao
Age por virtuosidade.
Quem não tem virtuosidade
Age pela caridade.
Quem nem disto é capaz,
Obedece a ritos e tradições.
Mas a dependência de ritualismos
É o ínfimo grau da moralidade.
É mesmo o início da decadência.
Quem julga poder substituir pela inteligência
A cultura do coração,
Esse é um tolo.
Pelo que, atende a isto:
O homem correto
Age por uma lei interna,
E não por mandamentos externos.
Bebe as águas da Fonte,
E não dos canais.
Transcende estes
E vai sempre à origem daquela.

* In: Tao Te King – Lao Tse (VI a.C)
Tradução de Humberto Rohden – 1985 – 5ª Edição – Editora Alvorada

Você sabe levar a vida menos a “sério”?

Outro dia estava assistindo a um programa de televisão que tratava do suicídio entre os jovens. Foram ao ar casos de adolescentes que diziam ter passado por profunda depressão e que, num determinado momento, decidiram colocar fim às suas vidas, acreditando, ser essa, a única forma de acabar com tamanho sofrimento.

No entanto, em todos aqueles casos, a tentativa de suicídio havia sido frustrada. Eles sobreviveram: sem pernas, o rosto desfigurado, com perda da visão, ou com qualquer outra pequena ou grande limitação. A vida havia vencido a morte.
E o mais interessante: todos diziam ter encontrado um novo sentido em suas vidas depois do ocorrido. Diziam ter aprendido a viver melhor e sentiam-se mais felizes.
Intrigada com o que ouvia, peguei-me pensando na intensidade dos acontecimentos.

Perguntas surgiam em minha mente quando eu tentava refletir sobre tudo isso. Qual seria o sentido do que havia ocorrido com essas pessoas? Qual era a base dessa transformação? O profundo sofrimento vivido?

Sabemos do altíssimo índice de suicídios na adolescência, chegando a níveis assustadores em alguns países. Vimos nos últimos tempos, principalmente nos EUA, estudantes matando colegas nas universidades, enquanto todos parecem viver num delírio coletivo de uma guerra contra o terrorismo, contra quem está lá, do outro lado do mundo. Sem um olhar cuidadoso, os jovens vão crescendo por aí, como podem. E, quando todos se dão conta, eles já tomaram para si, o direito de decidir quem vive e quem morre.

Todas essas histórias tristes que vemos parecem, na verdade, resultado da intolerância, que existe em nosso “mundo moderno”, à dor e à tristeza. Isso pode soar esquisito: sofremos com a intolerância à dor e à tristeza, sendo que a dor e a tristeza já são sofrimentos por si só? Sim, é fato. Sentir dor ou tristeza é sofrido, mas, pior do que isso é não poder sofrer a dor sentida. Nesse caso, os efeitos podem ser muito mais danosos, como vemos na situação desses adolescentes.

Em nossa sociedade há uma busca incessante pelo “não sentir”. Não há tolerância para o “fracasso”, o “erro”, o “atraso”, o “diferente”. Tudo tem de acontecer rápido, de modo perfeito e se transformar em um estrondoso sucesso.

As revistas de negócios lançam matérias de capa, enormes, com dados de pesquisa

e tudo o mais, que revelam a tamanha infelicidade dos considerados “executivos de sucesso”. À infelicidade deles, soma-se a da esposa (ou marido) que sente a falta do outro, e a dos filhos, que crescem também solitários, muitos sendo criados pela babá Ms. Internet.

A exigência, hoje, não é mais que se seja super em alguma coisa, mas sim super-hiper-extra-mega-blaster-e mais alguma coisa se for possível, em tudo. Não há tempo e espaço para que as pessoas possam chorar suas dores, ou rir da vida e de si mesmo. Não há tempo para ligar para os amigos (aliás, amigos? Que amigos? Só se forem aqueles 562 amigos virtuais que são mantidos nas diferentes redes sociais).

Os pais cada vez mais culpados, por não terem como criar seus filhos, pagam, não só financeiramente, um alto preço para tentar amenizar essa culpa e seus efeitos devastadores. A preocupação em ser super em tudo, faz com que esqueçam do maior compromisso consigo mesmos, nessa vida, que é a procura pelo bem-estar e a própria felicidade.

No mundo de hoje, quanto menos pudermos sentir, principalmente emoções desagradáveis e doloridas, melhor parece ser. No lugar do sofrimento, que poderia trazer crescimento, entra a “anestesia” que nos mantém cada vez mais alienados. Daí a indústria farmacológica lucrando, absurdamente, com isso.

Olho para tudo isso, lembro dos estudantes “suicidas”, e fico pensando nessa alienação, como fruto da falta de profundidade e leveza na vida moderna. Por mais paradoxal que possa parecer, só se pode ter leveza na vida, com algum nível de profundidade, e esta implica responsabilidade pessoal.

Em geral, quando ouvimos que somos responsáveis por nossa vida, nossa felicidade, muitas vezes temos vontade de sair correndo (Eu? Quem?). Já carregamos tanto peso por tanta coisa, e ainda temos que nos responsabilizar pela vida?
Muitos tendem a associar responsabilidade à seriedade e, por sua vez, seriedade à rigidez. Mas essa é uma visão parcial, que restringe, por demais, os conceitos.

Viver com responsabilidade nada tem a ver com rigidez. Ao contrário, tornar-se responsável pode significar levar a vida de forma mais leve, menos engessada, menos sobrecarregada de valores, que muitas vezes não são nossos, e não nos damos o direito de questionar.

Assim é que profundidade e leveza caminham juntas. O contato profundo com nossas emoções, sentimentos, dores, alegrias, desejos, sonhos, ajuda-nos a caminhar pela vida, de modo mais consciente, usufruindo cada momento de forma integral, e auxiliando-nos nas decisões do que queremos para nossa vida.

Fazer escolhas, mais adequadas a cada um de nós, é um privilégio e, ao mesmo tempo, um direito a ser exercido. Muitas pessoas agem como se não tivessem essa possibilidade, e acabam deixando-se levar pelos outros, ou levando tudo muito a “sério”, vivendo de modo rígido, sem qualquer consciência de como estão conduzindo suas vidas.

A rigidez de pensamento nos faz viver na superficialidade. Somente quando questionamos, no interior de nosso ser, as “verdades” que nos são passadas como “absolutas”, podemos sair do nível superficial e mergulhar em direção a uma existência mais real, viva e profunda.

Ouvimos, aos quatro cantos, que temos que ser sucesso em tudo, ou que somos os responsáveis pela mudança do mundo, pelo futuro do planeta. E, no fundo, somos mesmo, pois o futuro é o resultado do que escolhemos fazer no presente. Mas não há futuro algum sem presente, por isso é preciso viver com consciência o dia de hoje.

O exercício constante de voltarmo-nos para nosso mundo interior, proporcionando-nos momentos de paz, prazer, alegria, descanso e reflexão, ajuda-nos a separar o que são obrigações impostas, pelo mundo, e sem qualquer sentido para nós, do que realmente faz sentido em nossa existência.

Sempre que puder, pare e reflita: O que é sucesso para você? Atrás do que tanto corre todo dia? Onde está querendo chegar? E chegando lá, o que acha que encontrará?

Precisamos nos perguntar, no meio do turbilhão do dia-a-dia, quais são os sonhos e desejos que preenchem, alimentam e satisfazem nossa alma, e o que podemos fazer hoje por nós, por nosso meio, nossa casa, nossa cidade e, também, pelo nosso planeta.

Na aventura dessa viagem interior, podemos descobrir que muito do que buscamos lá fora já existe dentro de nós, a espera de que possamos parar, sentir e ouvir.
Ir atrás de realizar tudo que nossa alma anseia, tendo a sabedoria de desfrutar, cada dia, como se fosse o último, e cada experiência, como se fosse a primeira, levando a vida menos a “sério”, de forma mais solta e leve, e nem por isso menos consciente, pode nos trazer enorme satisfação em viver.

*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.

Você tem amigos ou apenas colegas?

COMPORTAMENTO

Você tem amigos ou apenas colegas?

‘Psicóloga explica que a diferença básica entre amigo e colega está na qualidade do vínculo’

É comum ouvir: “dá para contar nos dedos de uma só mão quem são meus verdadeiros amigos”.

“Sentimento fiel de afeição, simpatia, estima ou ternura entre pessoas que geralmente não são ligadas por laços de família ou por atração sexual”, assim o Novo Dicionário da Língua Portuguesa Aurélio define a palavra amizade.

No dia 18 de abril, comemora-se o ‘Dia do Amigo’, e até mesmo quem é apenas colega acaba sendo homenageado neste dia.

Segundo a psicóloga Ana Claudia Ferreira de Oliveira a amizade é algo importante para a vida de qualquer pessoa independente da sua idade já que o ser humano sente necessidade natural de compartilhar sentimentos e ideias.

Porém muitos se questionam: como fica a amizade em tempos de internet? Segundo dra. Ana Claudia, os sites de relacionamento e de conversa instantânea, por exemplo, possibilitam que nasçam amizades que talvez não existiriam sem esse canal. Seria praticamente impossível se relacionar com alguém do outro lado do mundo sem acesso a esta ferramenta.

Porém, ela lembra que o Orkut, por exemplo, traz uma noção distorcida dos relacionamentos e que pouco tem a ver com a amizade realmente. “Ninguém consegue abarcar 500 amigos sem falhar muito com a maioria deles; além disso o outro se interessa em virar seu “amigo” pois isso também aumenta a rede dele e ele então torna-se mais sociável e bem quisto na “rede” também, completa a psicóloga.

Folha – Existe até uma data para celebrar a amizade como o ‘Dia do Amigo’. Psicologicamente falando, qual é a importância da amizade na vida do ser humano?
Dra. Ana Claudia – A amizade é extremamente importante na vida de qualquer pessoa, seja ela criança, adolescente, madura ou idosa.  O ser humano é gregário por natureza e precisa compartilhar seus sentimentos, suas conquistas, suas ideias.

Amigos fazem bem à alma, ao coração e à saúde física também.

Na atualidade, com as constantes mudanças a que somos submetidos em ritmo acelerado, vivendo sempre sob o teto da incerteza do futuro, precisamos de um ponto de referência estável e confiável que possa servir de porto seguro. A amizade sincera e verdadeira pode ser o perfeito ponto de referência e segurança nesses momentos, nos ajudando a enfrentar os mais variados desafios nos diferentes ciclos da vida.

Folha – Como distinguir amigo de colega?

Dra. Ana Claudia – A diferença básica entre amigo e colega está na qualidade do vínculo.
Os amigos são mais próximos e mais presentes em nossas vidas. Essa proximidade tem a ver com intimidade. Amigos se conhecem mais profundamente e sabem mais de nosso jeito de sentir o mundo, nosso modo de nos relacionarmos com os outros, nossa forma de pensar e interpretar os fatos, nossas escolhas, etc.

A presença a que me refiro também não está necessariamente ligada à quantidade, mas à qualidade da relação. Temos colegas de trabalho, de escola, de clube, de academia, por exemplo, que encontramos às vezes diariamente, mas nem por isso, temos uma qualidade de vínculo que possa caracterizar essa pessoa como “amiga”.

Os colegas podem até saber muita coisa sobre nossas vidas porque convivem conosco, mas não são essas pessoas que tenderemos a procurar num momento de dor e alegria intensos. Queremos dividir nossas alegrias, tristezas, e intimidade com quem sentimos confiança, com quem sabemos que nos quer muito bem, que vai nos ouvir com carinho, e que vai tentar (ainda que nem sempre consiga) nos ajudar. Amigos se importam de verdade com nossos sentimentos e em como vai nossa vida. E as verdadeiras amizades são baseadas sempre no respeito à nossa singularidade e lealdade ao vínculo.

Folha – Por que é tão comum as pessoas confundirem amizade com coleguismo?
Dra. Ana Claudia – Nós podemos pensar em várias razões para essa confusão, mas a que mais me chama a atenção está ligada à ideia de “amor líquido”, trazida pelo escritor Zygmunt Bauman, que fala da fragilidade das relações humanas. Com a modernidade e as diversas demandas a que as pessoas são colocadas frente a frente em seu dia-a-dia, encontramos cada vez mais pessoas com dificuldade em se comprometerem consigo mesmas, quanto mais com seus pares. Há um temor enorme da intimidade com o outro, pois a intimidade exige honestidade para consigo mesmo e para com o outro. Não poderemos ser amigos de ninguém se não somos verdadeiros com o outro, e as pessoas temem se mostrar e serem julgadas por quem são.
Além disso, num mundo que acena com as infinitas possibilidades de conhecermos as mais diferentes pessoas, nos mais diversos ambientes, com as mais variadas oportunidades, o compromisso e o vínculo, a longo prazo, podem ser vistos como “perda” de outras oportunidades que surgiriam (e surgirão). As pessoas passam a temer o compromisso e, assim, vão mantendo vínculos menores, frágeis, como o coleguismo, e acabam por se esconderem dentro de si mesmas em profunda solidão.

Daí, temos aquelas pessoas que têm vários colegas a quem chamam de “amigos”, mas, na verdade, o vínculo estabelecido é extremamente frágil e se rompe facilmente, sendo a pessoa logo substituída por outra mais disponível.

Folha – Sempre é preciso que haja alguma afinidade para que duas pessoas se tornem amigas?

Dra. Ana Claudia – Sim, qualquer que seja ela. O fato é que uma amizade de verdade é feita com muito amor, e o amor surge e se fortalece com base nas afinidades. Essa história de que os opostos se atraem pode servir para as paixões, que são rápidas e fugazes. Mas o amor e a amizade precisam de constância, de incremento, de cuidado. E quando não há afinidade, porque vamos querer manter aquele vínculo? Sem afinidade a presença forte e constante daquela pessoa na nossa vida perde o sentido, e não havendo sentido, não há porque manter o laço.

Folha – Na infância, qual é a importância da amizade para o desenvolvimento social da criança?

Dra. Ana Claudia – A amizade é de extrema importância na infância, e em todas as outras fases da vida. A amizade é fundamental para que a criança desenvolva o sentido de intimidade, de confiança, do que é o compartilhar com o outro, de importar-se com o outro, e de tornar-se, por consequência, um ser social. A amizade deve começar dentro de casa, na relação dos pais com os filhos, da família com a criança. Essa relação será o modelo que a criança usará para estabelecer todos os seus outros vínculos, sejam amores ou amizades. Quanto mais forte for esse vínculo (e isso é bem diferente de pais e mães que querem manter seus filhos atados a eles como se não pudessem ter vida própria), mais estrutura ele dará para a criança estabelecer seus demais laços na vida. Um vínculo é forte quando ele é verdadeiro, íntegro e respeita a individualidade e a intimidade de cada um.

Folha – A internet é boa ou má para as relações de amizades que existiam sem ela?
Dra. Ana Claudia – A Internet não é por si só “boa” ou “má”. Ela é um canal de acesso a um mundo de oportunidades, e traz mais uma ou várias possibilidades para nos relacionarmos, conhecer pessoas, e manter contato com diferentes povos, temas e assuntos que de outra forma não teríamos acesso. Dependendo de seu uso é que ela se tornará boa ou má, pois esse uso é que determinará as consequências, que poderão ser boas, más ou neutras na vida de uma pessoa.

As amizades que existiam antes dela, podem continuar a existir, e isso só depende de quem está envolvido na relação. A amizade precisa ser cultivada como uma plantinha. Caso contrário, ela morre.

Penso que a internet traz a possibilidade de se criarem laços de amizade que não poderiam talvez existir sem ela, simplesmente pela facilidade de acesso que ela proporciona. Agora, manter esse vínculo ou não é tarefa e escolha de cada um.

Folha – É possível ter um relacionamento de amizade saudável somente a partir das salas de bate-papo ou dos sites de relacionamento?

Dra. Ana Claudia – As salas de bate-papo e os sites de relacionamento são portas de entrada. Uma vez que você entre, você pode decidir ficar ou não. O que quero dizer com isso é que elas oferecem oportunidade de conhecermos pessoas diferentes, dos mais diversos lugares do mundo. Principalmente para os mais tímidos, que tem medo de se expor, ela é de grande ajuda. Mas se o relacionamento só fica na sala ou no site, dificilmente ele irá durar ao longo do tempo e, daí, penso que não podemos dizer que se trate de uma amizade realmente. A amizade pede investimento, constância, cuidado e intimidade. Na Internet há como se ter intimidade virtual somente, mas não real.

Folha – E o Orkut? Existem pessoas que exibem mais de 500 amigos em seu perfil…
Dra. Ana Claudia – O Orkut é outro fenômeno interessante dessa nova era. Na verdade, penso que as principais questões que envolvem o sucesso e o problema do Orkut são três:  A primeira questão está ligada ao sentimento de pertencimento e aceitação, ou seja, se você vai ser “autorizado” a entrar para o clube (que de privado não tem nada, pois tudo é exposto a quem queira bisbilhotar) ou não, uma vez que você só entra se tiver algum amigo que o convide; a segunda questão está ligada ao quão social e sociável você é, classificando-se dependendo da quantidade de “amigos” que você for autorizado a incluir na sua “rede”, o que pode ser extremamente falso e em geral é, pois ninguém consegue abarcar 500 amigos sem falhar muito com a maioria deles; além disso o outro se interessa em virar seu “amigo” pois isso também aumenta a rede dele e ele então torna-se mais sociável e bem quisto na “rede” também; e a última questão é o intuito de bisbilhotar a vida alheia: saber se aquele ex-namorado já se casou, se sua ex-mulher já tem outros filhos, se sua paixão não correspondida de adolescência ainda está solteira por aí, se sua amiga ainda se relaciona com aquela outra pessoa que você não pode nem ver…e por aí vai…

Mas falar em amizade de verdade nesse tipo de ambiente é quase impossível. O Orkut, como tantos outros sites de relacionamento e chats, serve para aplacar a dor da solidão. O grande problema é que todos esses artifícios, como o próprio nome diz, só servem de muleta para que a pessoa não se dê conta de sua imensa tristeza e vazio interior, e não enfrente seus medos na busca de uma amizade ou relação amorosa de verdade.

Folha – Espaço para considerações sobre o assunto…

Dra. Ana Claudia – Gostaria de terminar essa entrevista citando um trecho que li outro dia no jornal quando comentavam o livro “Amor líquido” do Zygmunt Bauman e que fala um pouco sobre essa questão da Internet e dos sites. Diz assim: “quanto mais próximo é um relacionamento, mais ele parece ao mesmo tempo uma promessa e uma ameaça. Não admira que uma “rede” possa parecer uma alternativa sedutora aos laços. Em uma rede, como você sabe, desligar-se é tão fácil quanto ligar-se”.

Matéria veiculada no jornal Folha da Cidade na edição do dia 13 de abril de 2007.
Redação: Aline Pasin (MTB 41.456)

*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.

 

A importância do autoconhecimento

Quando não nos conhecemos, não sabemos o que se passa no íntimo de nosso ser, e como reagiremos às várias situações a que seremos colocados frente a frente na vida, conforme caminhamos nessa ou naquela direção.

Nesse caso, só nos restará caminhar e lidar com as situações conforme elas forem vindo.

Quando nos conhecemos, sabemos quem somos, como sentimos, e como as situações nos tocam. Nesse caso, temos cinco opções durante nossa trajetória:

  1. Mudar o rumo e a direção, escolhendo outro caminho;
  2. Adiar o momento de caminhar em direção àquela situação;
  3. Mudar o modo como caminharemos até aquela situação e como ficaremos nela;
  4. Escolhermos simplesmente não caminharmos em direção àquela situação; ou
  5. Seguir aquele rumo e direção tendo noção do que vamos enfrentar e nos preparando para lidarmos da melhor forma possível com aquela situação.

Percebem a diferença?

E lembrem-se: conhecer-se ou não também é questão de escolha!

Aliás, como tudo na vida.

Tenham um ótimo dia!

*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.

Medo da mudança

Como as pessoas têm medo de mudar!

Todos reclamam de suas vidas, de seus relacionamentos, de seus trabalhos, do salário, dos amigos, do marido, da mulher, e por aí vai. Reclamam como se sua vida não fosse escolha própria, como se tivessem sido obrigados a viver o que estão vivendo. “Esquecem” que são inteiramente responsáveis por aquilo que estão vivendo ou deixando de viver.

Se sua vida não está legal, mude. Se não trabalha no que gosta, mude. Se não está feliz no seu casamento, mude. Você deve estar pensando: “As coisas não são tão simples assim!”

E talvez não sejam mesmo. Mas será que são tão difíceis e impossíveis como a maioria das pessoas acredita?

Tente enxergar as possibilidades de mudança. Muitas vezes o diálogo pode acertar muita coisa entre um casal, entre um chefe e sua equipe, entre pais e filhos, ou entre amigos. Outras vezes, algumas atitudes mais diretas e efetivas precisam ser tomadas.

Para mudar, precisamos saber não só o que nos desagrada em nossas vidas, mas também o que nos agradaria, para que possamos direcionar nossos objetivos para isso. E, em qualquer situação, o que realmente faz a diferença é a atitude de coragem e fé na busca por uma vida melhor.

Quem não se arrisca a sair do cômodo e conhecido, não lida com seus medos e não se realiza. Vive preso em seus próprios medos e receios. E nesse caminho, é muito fácil achar culpados para sua própria infelicidade.

A questão é que não existem vítimas e culpados. Existem pessoas responsáveis por suas vidas.

Se você não assumir e encarar essa verdade, então você está escolhendo, ainda que indiretamente, entregar nas mãos do outro a responsabilidade pela sua vida. Nesse caso, você está “escolhendo” assumir o papel de vítima das circunstâncias.

Se você chama a si a responsabilidade pela sua vida e felicidade, você assume o papel de agente de mudança e pode fazer toda a diferença na busca pelos seus sonhos e realizações.

 

*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.

 

A cirurgia plástica e seu corpo

Nesses tempos de hoje, com a medicina estética tão avançada, com técnicas novas e materiais mais preparados, a cirurgia plástica tem feito muito sucesso entre homens e mulheres preocupados com a beleza, o bem-estar e a imagem.

Chegando perto do verão onde os corpos estão mais à mostra, cresce a procura por esse tipo de procedimento. Pode ser uma barriguinha para ser diminuída, mamas que precisam ser reposicionadas, rugas para serem eliminadas, gorduras localizadas, etc. Normalmente as intervenções são mais estéticas do que ligadas a problemas de saúde, embora existam casos em que o procedimento é indicado pelas duas razões.

Os motivos que levam uma pessoa a buscar alguma correção estética podem ser os mais variados e normalmente há, aliadas às razões aparentes e físicas, motivações subjetivas impulsionando a procura pela cirurgia plástica.

A questão é que muitos acreditam que a cirurgia irá mudar suas vidas. Pensamentos do tipo: “assim que eliminar essa barriga serei feliz”, ou “assim que colocar silicone nos seios serei outra mulher”, são recorrentes entre as pessoas que buscam esse tipo de procedimento. Colocam na cirurgia plástica a responsabilidade pela transformação em suas vidas e pelo encontro com a felicidade tão almejada.

Nesses casos é comum aparecer uma frustração enorme após a cirurgia, posto que a mudança tão esperada não acontece. Houve uma intervenção perfeita do ponto de vista médico, mas que nada mudou além do físico. Pessoas que fazem, por exemplo, uma cirurgia de reposicionamento das mamas ou de diminuição do volume podem continuar a agir, após a cirurgia, como se ainda estivessem na forma antiga, curvando os ombros para frente na tentativa de “esconder” os seios flácidos ou volumosos. O que se percebe nesses casos é que se operou uma mudança do ponto de vista físico, mas não do ponto de vista psíquico. O corpo mudou, mas o psiquismo não acompanhou. A imagem que se tem de si não é alterada porque não integra a nova forma corporal.

Toda mudança por mais necessária e bem-vinda que seja, precisa ser trabalhada interiormente para que surta o máximo do efeito esperado. Avaliar as reais motivações para a cirurgia, as expectativas, os resultados esperados, tudo isso é importante como parte do processo de transformação.

Por mais que uma mudança física possa promover um aumento de autoestima e do bem-estar pessoal, é importante que se faça essa avaliação para se tenha consciência de que o processo de transformação físico é um, e o processo de mudança psíquico é outro. Eles podem andar lado a lado, e melhor seria que assim se desse com todos os pacientes, o que nem sempre é possível.

Muitos estão inconscientes de suas próprias emoções, e buscam avidamente uma transformação que se dê de fora para dentro e os livre do contato com angústias e motivações subjetivas. Aliás, é comum vermos pessoas buscando transformações físicas quando, na verdade, precisam e até desejam fazer toda uma mudança de vida. Entretanto como não querem se comprometer emocionalmente com isso, acabam preferindo colocar na cirurgia a responsabilidade por uma vida melhor. Como aquela pessoa que acha que mudando de cidade, de país ou de emprego, irá se livrar, por exemplo, dos problemas que enfrenta atualmente nesses lugares. De novo se verá apenas uma mudança geográfica que, se não for acompanhada de uma proposta de reformulação interior, poderá até trazer algum alívio temporário, mas não trará efeito algum permanente.

Assim, por mais desejada e esperada que possa ser uma cirurgia plástica é preciso se questionar se é esse mesmo o caminho que levará a conquista do objetivo almejado. Entender as emoções que estão em jogo na busca por um corpo melhor ou “perfeito” pode ajudar a pessoa a se conhecer melhor, aceitar suas limitações e evitar procedimentos cirúrgicos desnecessários, ou ainda, fazer com que as intervenções que se mostrem necessárias, desejadas e possíveis de serem feitas, possam ser integradas harmoniosamente ao todo daquela pessoa, trazendo o efeito tão esperado ou chegando o mais próximo disso.

A garantia que se tem é de que, lidando com a realidade dos fatos e a própria realidade emocional, evitam-se mais frustrações ao final do processo, e a satisfação, tanto com o próprio corpo como com os efeitos da cirurgia, poderá ser sempre maior.

*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.

Mudanças no corpo, mudanças na alma

Esses dias, por conta de um trabalho que estou realizando, estive conversando com muitas pessoas que se mostraram extremamente descontentes com seus corpos e sua aparência física. Ao contrário do que acontece com pessoas com dismorfia corporal (distúrbio em que a pessoa apresenta distorção de imagem corporal), fui obrigada a concordar que aquelas pessoas não pareciam bem em seus corpos.

Não se tratavam apenas de pessoas com muito ou pouco peso, pessoas obesas, ou mesmo pessoas só “malcuidadas”. O que chamava a atenção em todas elas, é que havia desarmonia em seus corpos e em sua aparência, e essa desarmonia revelava-se ainda mais pungente quando começavam a falar de si.

Fiquei pensando no tamanho desconhecimento de si e no pouquíssimo contato que mantinham com elas mesmas.

Era possível notar que a maioria estava disposta a fazer algo para mudar a situação de insatisfação pessoal. Aliás, todas elas sabiam o que precisava e o que podia ser feito: dietas, exercícios físicos, mudança de hábitos alimentares, cuidados pessoais, um corte de cabelo, uma tintura; enfim, receitas todas elas tinham, mas quando se tratava de colocá-las em prática, transformando o desejo em realidade, o processo não caminhava.

E por que será que isso acontece? Se pararmos para avaliar melhor, veremos que situações semelhantes a essa nos acometem a todo momento. Além de questões em termos de corpo e aparência física, podemos pensar em tantas situações de vida por que passamos, de sonhos que desejamos e não realizamos, objetivos que nos parecem impossíveis de serem alcançados, e então, vamos deixando de lado…

Podemos pensar as mais diversas razões para explicar tal desencontro. Mas há uma questão que considero muito mais simples, e que pode ser de grande valia para refletirmos sobre essas dificuldades.

Pois bem. Voltemos ao corpo.

Nosso corpo físico e a aparência que temos são apenas reflexo de nossa alma e de nosso ser interior. Mesmo com todas as fórmulas e receitas disponíveis em nosso meio, e mesmo com todo o dinheiro do mundo, nenhuma pessoa conseguirá fazer de seu corpo um lugar harmônico se não houver equilíbrio interior, porque o corpo é o espelho para o mundo exterior de tudo o que se passa dentro de nós.

Se em nossa alma as coisas vão bem, se estamos em harmonia com nosso ser, com nossos desejos, sonhos, crenças, e se tudo isso nos faz bem ao coração, então nossa aparência física transmitirá isso. Se não estamos bem interiormente, se nossa alma está sendo deixada em segundo plano, se nossos desejos não estão sendo atendidos, se não nos tratamos com carinho e respeito, então, toda essa desarmonia interior se revelará em nossa aparência.

Muitas pessoas estão tão preocupadas com a imagem que vão passar aos outros, ou com modelos de beleza apregoados aos quatro cantos, que esquecem de olhar para dentro de si.

A questão é que não se trata de ser bonito ou feio, nem de atender a padrões estéticos de nossos tempos modernos, mas de ouvir nossa voz interior, respeitando o ritmo natural de nosso corpo e de nossa alma, reencontrando, assim, o equilíbrio perdido.

Assim, se queremos realizar mudanças em nosso corpo, e daí podermos expandir para tantas outras mudanças que queremos em nossa vida, precisamos desviar a atenção do “externo” e focar naquilo que se passa em nossa alma, entrando em contato com a sabedoria universal e a natureza divina que reside em cada um de nós.

A natureza é perfeita, e nós somos parte dessa natureza; assim, também podemos fazer brotar essa perfeição e essa beleza de dentro de nós e revelá-la ao mundo, seja através de nosso corpo, nossa aparência ou de nossas atitudes e posturas diante da vida.

Na essência de nosso ser encontra-se o segredo para uma vida mais plena. Muitas vezes para chegar até lá, temos de enfrentar caminhos um pouco difíceis e algumas estradas sinuosas e incômodas que fazem parte do processo. Podemos encontrar muita coisa considerada “feia” aos olhos do mundo e de nosso próprio julgamento, situações incômodas que permanecem escondidas e estagnadas dentro de nós, e que, por parecerem impossíveis de se enfrentar vão, aos poucos, silenciosamente, consumindo nossa energia e nossa vitalidade. São com essas questões esquecidas dentro de nós que precisamos nos haver para poder limpar a área e abrir espaço para que novos sonhos e desejos possam se realizar.

Aceitar a si mesmo, integralmente, não só naquilo que é belo, mas em tudo que somos de mais verdadeiro e profundo, incluindo o que pode ser falho e desconfortável, nos ajuda a transformar situações e caminhar em direção a uma vida melhor. Por mais contraditório que possa parecer, é esse processo que nos permite revelar nossa real beleza interior. O resultado quase que automático disso se refletirá em um corpo com uma aparência física mais harmônica e equilibrada, e em uma vida mais plena de sentidos e realizações.

*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.

Obesidade e os riscos da cirurgia bariátrica

A obesidade representa um dos maiores problemas de saúde enfrentados atualmente no mundo todo. Hoje em dia já se tem notícia de muitas pessoas que morrem em razão de complicações orgânicas causadas pelo excesso de peso.

Independente da ditadura da magreza, é certo que ninguém gosta de se ver e se sentir gordo ou gorda. Como tudo que existe em excesso, gordura demais no corpo não faz bem. É sinal de algum desequilíbrio.

Do ponto de vista físico há excesso de peso sempre que a quantidade de comida ingerida é muito maior que o gasto energético, quando, então, acontece um armazenamento da sobra de energia sob a forma de gordura.

Dependendo da quantidade de gordura em sobra no corpo, a pessoa pode ser considerada, em termos gerais, “acima do peso” (IMC• entre 25 e 30); “obesa – grau I” (IMC entre 30 e 35); “obesa – grau II” (IMC entre 35 e 40); ou “obesa mórbida – obesidade grau III” (IMC acima de 40).

As causas físicas da obesidade são variadas. Ela pode estar relacionada à hereditariedade, deficiências na molécula leptina (que controla a quebra e a utilização da gordura), ou a alterações hormonais, principalmente na glândula tireoide. Alguns medicamentos a base de cortisona, como os antialérgicos, bem como alguns antidepressivos e anticoncepcionais podem contribuir para o excesso de peso.

Hábitos ruins como “beliscar” o dia todo, comer muito rápido sem saborear o alimento, comer frituras e doces muito gordurosos, levar uma vida sedentária e estressante, tudo isso colabora para o ganho de quilos extras.

Esses hábitos ruins podem estar mascarando conflitos emocionais que podem estar na base do problema. Ansiedade, depressão e uma baixa autoestima podem favorecer o aumento de peso e dificultar a sua perda.

As pessoas que estão muito acima do seu peso sentem-se mal, feias e rejeitadas pelos olhares alheios. As roupas não vestem bem, a pessoa se cansa mais facilmente, e há uma constante cobrança interna e externa para emagrecer.

Os obesos são, em geral, profundos conhecedores de todo tipo de dieta e das calorias presentes em vários alimentos. Sabem e, em geral, já tentaram por mais de uma vez na vida, desde as dietas mais tradicionais até as mais esdrúxulas que já ouvimos falar.

Normalmente conseguem emagrecer fazendo restrições alimentares e esforços físicos, ou até mesmo, tomando uma medicação que auxilia de algum modo na diminuição do peso corporal. Mas o fato é que se não há um trabalho de autoconhecimento, de entendimento do porquê daquele desequilibro expresso no corpo através do excesso de peso, voltam a engordar tudo que perderam e às vezes até mais um pouco, sentindo-se, ao final do processo, muito frustrados e com a sensação de fracasso e descontrole.

Nesse processo conhecido como “efeito sanfona”, muitas pessoas vão ultrapassando os limites do excesso de peso e da obesidade, e chegam a entrar na faixa da obesidade mórbida, apresentando um peso muito elevado e sérias complicações físicas.

Para tratar do excesso de peso é preciso aliar uma dieta de baixas calorias, exercícios físicos, e sempre que possível, acompanhamento psicoterapêutico, para que os fatores emocionais que estão influenciando e contribuindo no acúmulo de gordura ou dificultando a mudança dos “maus hábitos” sejam vistos e tratados.

Entretanto, hoje em dia, a medicina oferece como alternativa no tratamento da obesidade mórbida, a cirurgia bariátrica ou de “redução de estômago”, como é popularmente conhecida. Para alguns médicos, o obeso mórbido é considerado um paciente portador de uma doença grave, que ameaça a vida e que, por isso, requereria medidas eficientes para a promoção de perda de peso definitiva.
O objetivo da cirurgia bariátrica é a indução da perda de peso por meios cirúrgicos. A cirurgia pode ser restritiva quando se reduz a capacidade de armazenamento do estômago e a velocidade de esvaziamento (mais conhecida como “redução de estômago”); ou pode ser disabsortiva quando se retiram segmentos do intestino delgado, encurtando-o e reduzindo o tempo que os nutrientes permanecem no intestino, o que dificulta sua absorção. A cirurgia pode ainda ser mista, quando as duas técnicas são utilizadas.

O fato é que muitas pessoas estão recorrendo a essa cirurgia achando que ela é a “salvação da lavoura”. É muito mais fácil e, muito comum hoje em dia em nossa sociedade, a busca de medidas drásticas e definitivas para solução de alguns problemas, sem que a pessoa queria se comprometer de verdade com o processo. Essa postura de querer tudo para ontem e já, e da forma menos responsável possível pode não só ser ineficiente para o resultado esperado, como trazer várias outras complicações psíquicas e físicas.

Os riscos da cirurgia bariátrica são ainda muitos e alguns desconhecidos pelos próprios médicos, haja vista que o método é novo e cada organismo é único e pode responder de maneiras diversas a uma intervenção cirúrgica desse porte. Além das reações orgânicas, não podemos nos esquecer dos efeitos psíquicos e emocionais.

Imagine o caso de uma pessoa que tinha no comer a alegria da sua vida, e com a redução do estômago, ela não pode mais comer a mesma quantidade de comida, e muitos não podem comer quase nada comparado ao que comiam antes da cirurgia.

Essa pessoa tende a entrar em processo de profunda depressão e tristeza, podendo vir a apresentar várias complicações físicas até mesmo em razão do seu padrão emocional alterado. Outras pessoas reagem com comportamentos maníacos, passando a substituir o comer compulsivo por outras compulsões como comprar em excesso, beber em excesso, se drogar, trabalhar compulsivamente, e outras atividades tão ou mais perigosas e desequilibradas como essas. Ou seja, corre-se o risco de trocar um sofrimento por outro.

É importante ter em mente que emagrecer é um processo. Não acontece da noite para o dia. Aliás, chama a atenção dos profissionais que trabalham com pacientes obesos, o fato de que muitos passam vários anos engordando aos poucos e não se dão conta da mudança que está acontecendo em seu corpo. Se se passam anos adquirindo peso e gordura, porque queremos que nosso corpo seja imediato em responder a uma dieta ou a alguma rotina nova de exercícios físicos?

Para emagrecer é preciso se comprometer com o objetivo, respeitar seus próprios limites, aprender a ouvir o próprio corpo, entender porque engordamos tanto, o que nos faz comer em excesso sem pensar e sem sentir o que estamos comendo, o que aconteceria ou como nos sentiríamos se estivéssemos magros e em boa forma. Essas e tantas outras questões envolvidas no processo de engordar e emagrecer só podem ser respondidas se há um trabalho interior de tomada de consciência e de responsabilização do próprio sujeito com seu corpo, seu eu e sua vida.

O grande desafio para a conquista da saúde e do peso ideal é o equilíbrio emocional. Para se alcançar esse equilíbrio é preciso nos voltarmos para nosso interior, experimentar um contato mais profundo com os próprios sentimentos, motivações, fantasias e conflitos, ou seja, tomar consciência de tudo que se processa em nosso mundo interno e que nos leva a ganhar peso em excesso ou que dificulta nosso processo de  emagrecimento. Nesse sentido, se não estamos conseguindo realizar esse trabalho sozinhos, o que às vezes é mesmo muito difícil, vale refletir sobre a possibilidade de buscar ajuda terapêutica especializada, seja para um trabalho de psicoterapia individual ou em grupo.

Principalmente para quem pensa em se submeter a um processo como o da cirurgia bariátrica, é muito importante o acompanhamento psicológico com um profissional da sua confiança. Buscar ajuda psicoterápica, avaliar os prós e os contras antes de decidir por uma intervenção desse porte, além de buscar outras alternativas menos drásticas para a perda de peso, podem ser medidas a serem levadas em conta na busca por um corpo e mente mais saudáveis e uma vida emocional mais equilibrada.

• O IMC é o índice de massa corporal, que é obtido dividindo-se o peso (em quilos) pela altura (em metros) elevada ao quadrado. IMC=P/H².   A faixa de peso considerada normal está entre 19 a 25 kg/m².

 

*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.