Hoje em dia é cada vez maior o número de filhos que mesmo após atingirem a maioridade e até mesmo alguma independência financeira, permanecem vivendo na casa dos pais.
Encontramos adultos com idades variando entre 25 e 40 anos que, por alguma razão, não conseguem sair da casa paterna. Muitos estão acomodados nessa situação, e muitos pais também se adaptam bem e até preferem que essa condição se perpetue.
Em geral, pais e mães mais saudáveis psiquicamente, de bem com suas próprias vidas e seus casamentos, ajudam os filhos a seguirem seu próprio caminho a partir de um certo momento da vida. E isso inclui, não necessariamente que esse filho ou filha se casem, tenham filhos, mas, que consigam ter autonomia e vida própria, o que significa ter uma vida profissional e social própria, um trabalho remunerado, sua própria casa, pagar suas contas, e fazer suas escolhas com mais independência.
Diferente do que acontecia há alguns anos, quando os filhos saíam da casa dos pais para casar, hoje, está cada vez mais difícil que isso aconteça. As pessoas estão descobrindo que não precisam necessariamente se casar para serem felizes, ou que pelo menos, podem adiar essa decisão por mais alguns anos. É certo que muitas vezes esse adiamento está ligado a uma impossibilidade de crescer e assumir responsabilidades pela própria vida. E aí é que mora o perigo.
Escolher não se casar logo cedo, ou simplesmente não casar, é uma decisão que pode e deve ser tomada se a pessoa sente que é o melhor para ela. Aliás, quanto mais maduros estivermos para tomar uma decisão desse porte, melhor poderemos decidir, e estaremos menos sujeitos a erros e enganos.
Entretanto, não deveria ser por esse motivo, que os filhos adultos permanecessem na casa dos pais, sem fazer sua própria vida. Crescer e casar são coisas independentes. Não é porque não se casa, que não está na hora de o filho seguir seu próprio rumo. O crescimento é inevitável, o casamento é uma escolha. Será verdade? Em parte.
Crescer também depende de uma escolha. Primeiro, depende da escolha dos pais em “empurrar” os filhos para a vida em vez de prendê-los sob seus cuidados como se fossem seres incapazes de se cuidar sozinhos. E segundo, depende da escolha dos filhos em assumir ou não a responsabilidade por suas próprias vidas e sua autonomia.
Até para crescermos do ponto de vista biológico, precisamos de um investimento dos pais. São eles que nos alimentam, cuidam de nossa saúde, nos ensinam a andar, falar, enfim, oferecem os estímulos necessários ao nosso desenvolvimento saudável. Quando falamos do crescimento psíquico não é diferente. Os filhos precisam também de estímulo nesse sentido. E só pais que realmente cresceram no sentido psíquico e emocional, e alcançaram algum nível de autonomia e maturidade, podem ajudar e favorecer o crescimento dos filhos.
Estudos na área mostram que a chamada “fase da adolescência” que precede à entrada na vida adulta está durando cada vez mais. Antes, considerava-se adolescente a pessoa entre 12 e 18 anos. Depois, essa faixa se estendeu até 21, depois 24, e hoje já falamos em adolescentes com 35, 36 anos. Isso acontece porque a adolescência em si mesma não é uma fase da vida propriamente dita, estabelecida apenas cronologicamente, mas sim, um período da vida marcado por determinadas situações que incluem alterações físicas e psíquicas, mas que também é marcado por comportamentos específicos, relativos a esse período da vida. Por isso, não é de se estranhar que cada vez mais encontremos pessoas que embora tenham idade e físico de um adulto, apresentem atitudes, comportamentos e pensamentos de adolescente.
O que será que está acontecendo em nossa sociedade? Qual será a razão desse fenômeno conhecido como adolescência estar se estendendo de tal forma no tempo que vemos os jovens “adolescerem”, mas nunca mais saírem dessa posição?
Com a valorização do ensino universitário em detrimento do trabalho técnico, os jovens são, cada vez mais, estimulados a estudar e a dar a importância à formação universitária, o que é claro e evidente, tem seu valor. Entretanto, o processo de uma boa formação universitária é longo e atrasa a entrada do jovem no mundo adulto.
Ele passa mais tempo sob a custódia financeira dos pais e mais tempo com menos responsabilidades, mas nem por isso deixa de viver algumas ou muitas das vantagens e dos prazeres de ser adulto. A questão que fica é: “se posso viver e desfrutar dos meus anos de juventude sem me responsabilizar efetivamente por isso, visto que meus pais estão fazendo isso por mim, porque me interessaria crescer e tornar-me adulto?”.
Além desse aspecto, podemos pensar na dificuldade de alguns pais em ajudarem seus filhos a crescerem e tomarem rumo em suas vidas. Essa dificuldade pode estar relacionada a vários aspectos. Se esses pais puderam crescer individualmente e como casal, puderam fazer suas escolhas e lidar com o saldo positivo ou negativo de suas escolhas, eles terão mais facilidade em colaborar no crescimento dos filhos. Se esses pais estão de bem com suas próprias vidas, e puderam, até então, desfrutá-las, também será mais fácil que se encaminhem nesse sentido com relação aos filhos, deixando-os viverem por si mesmos, respeitando suas escolhas pessoais e usufruindo os ganhos que o crescimento de seus filhos podem trazer ao relacionamento familiar, inclusive.
Entretanto, se esses pais sentem-se frustrados em suas próprias vidas, em seus casamentos, ou em suas escolhas pessoais e profissionais, eles tenderão a tentar viver seus ideais e desejos insatisfeitos por meio dos filhos.
Isso pode acontecer de duas formas: ou eles impõem seus desejos e sonhos aos filhos; ou impedem que esses filhos cresçam de qualquer maneira. Porque se esses filhos crescem e fazem suas próprias vidas, isso leva os pais a questionar o que têm feito de suas vidas até então, e se a resposta encontrada não for agradável, surgirá a necessidade de mudança.
Se os pais se dispõem a viver, a fazer algo por si, ainda que tardiamente, eles podem usar o crescimento dos filhos como espelho para mudanças favoráveis e significativas em suas próprias vidas.
Mas, se esses pais não têm coragem de se olhar e questionar sua própria experiência com muita maturidade, fazer com que esses filhos não cresçam e não saiam de suas casas ou de seus cuidados é uma forma de não questionar o que estão fazendo de suas vidas, e manter a situação no estado em que se encontra, sem os riscos de uma mudança, ainda que estejam totalmente infelizes. Além disso, manter os filhos como pseudo-adolescentes, lhes dá a falsa noção de que não estão envelhecendo, e de que disporiam ainda de muito tempo caso quisessem vir a fazer algo por si mesmos.
A verdade, no entanto, é que o tempo não perdoa. Mesmo que pais e filhos escolham não crescer, a vida passa para todos. Felizes daqueles que, cedo ou tarde, percebem o quão curta é a vida e decidem correr o risco de viver e ir em busca da própria felicidade. Como já dissemos tantas outras vezes, tomar nas mãos as rédeas de sua vida, crescendo e assumindo sua autonomia e as responsabilidades pelas escolhas pessoais é o caminho para se viver melhor e mais feliz.
*Ana Claudia Ferreira de Oliveira é Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Psicanalista em São Paulo.